Tuitando nas asas da legalidade

Com a alternância de preferência das redes sociais, hoje se escuta o canto do Twitter. A ave azul que aqui gorjeia abriga revoadas de seguidos e perseguidos.

Superado o infantil target sobre o quê cada um anda fazendo, se compartilha acontecimentos e informações em tempo real, de qualquer lugar do mundo.

Como os brasileiros figuram no honroso quinto lugar da lista dos maiores usuários da ferramenta, receberam como afago a tradução para o português de algumas páginas.

A criatividade é infinita: usuários comentam sobre tudo, sobre o nada, divagam, avisam sobre a localização de blitz, mobilizam encontros e na porção consumidores enviam pios de protestos e denúncias. Políticos renunciam e desrenunciam, artistas protegem seus anjos e formadores de opinião enxergam oportunidades para gerar receita.

As empresas ali se aninham para divulgar produtos, informar eventos, firmar parcerias, lançar campanhas e fidelizar clientes. Também contratam ronda virtual para monitorar sua reputação online.

Ocorre que aquele algo de podre no reino da web, já tão conhecido, começa a migrar para este micro blog. Tuiteiros mal intencionados criam contas falsas, contas clone, contas de protesto e contas difamatórias. Nomes de empresas e pessoas naturais são registrados por terceiros, clonados, resgates financeiros podem ser exigidos e um mercado negro se instala.

Já sobrevoa no tuiter o indesejável spam, o registro indevido de nomes, o uso de marca e de imagem de terceiros, casos de concorrência desleal, e por aí vai.

Ou seja, um dejá vu de  práticas ilegais de outras redes, que agora migram para esse arquipélago.

A atenta administração tuiter publica seu regulamento e as regras a serem seguidas. Aceita registro de queixas e reclamações de violação de direito autoral, de uso de marca, de assédio e ameaças de violência.

Prometem suspender a conta de posseiros, de spamers, de filtradores de feeds de terceiros e de comerciantes de contas. E em porção bem brasileira fornece ajuda do “manual de cócoras” e do “relato de favela”.

Mas será que o Twitter conseguirá resolver internamente todos esses quiprocós? Vamos sugerir a criação do “espaço barraco” para abrigar um centro interno de resolução extrajudicial de conflitos.

Bem, se for preciso registrar denúncia, informo que o help center só escuta em língua inglesa. E se o problema relatado não for resolvido, envie correspondência postal para a sede: San Francisco, Califórnia, USA.

Ou seja: nenhuma dúvida de que essas questões irão aterrisar no Poder Judiciário.

Mas como o micro blog ainda não está instalado no Brasil pode-se utilizar os bons serviços prestados pela Organização Mundial da Propriedade Intelectual.

ps: Vale conhecer a cartilha do CAIS com recomendações de segurança em redes sociais.

Publicado no MXMasters

Mandado de segurança por meio eletrônico

A Lei 12.016/2009 veio atualizar as normas disciplinadoras do mandado de segurança individual e coletivo, instrumento de garantia fundamental a proteção de direito líquido e certo.

O novo marco legal estabelece a forma de encaminhamento da petição inicial perante o órgão jurisdicional, determinando que somente em caso de urgência o requerimento pode se dar por telegrama, radiograma, fax ou outro meio eletrônico de autenticidade comprovada.

Registrando-se que esse remédio legal somente é administrado em caso de urgência, o referido dispositivo comete a impropriedade de equiparar o meio eletrônico a outros sistemas de comunicação que não guardam qualquer padrão de similaridade.

Paradoxalmente o texto legal estabelece a obrigatoriedade de apresentação do “texto original da petição” no prazo de cinco dias, ao mesmo passo que consigna a necessidade de adoção de “regras da ICP-Brasil”, quando se tratar de documento eletrônico.

Percebe-se, portanto, uma imprópria alquimia das Leis 9.800/99 e 11.419/06, comandos legais que regulam práticas processuais absolutamente distintas.

A Lei 9.800/99, conhecida por a “lei do fax” inaugurou procedimento não obrigatório, auxiliar à clássica protocolização presencial, proporcionando a utilização de sistema de transmissão de dados e imagens – tipo fac-símile ou outro similar – para a prática de atos processuais que dependam de petição escrita. A norma prescreve a obrigatoriedade da ratificação do ato com a apresentação do original em juízo no prazo de cinco dias da data da recepção do material.

A Lei 11.419/06 concedeu a base legal ao processo judicial totalmente informatizado, possibilitando a distribuição por meio eletrônico da peça inicial, encaminhada diretamente ao órgão jurisdicional que disponibilize sistema de processamento eletrônico.

Como visto, enquanto a lei do fax exige a apresentação do original em juízo no prazo de cinco dias contados de sua transmissão, tal obrigatoriedade inexiste na lei do processo eletrônico, por contrariar seu próprio fundamento.

Por outro lado, o texto legal refere-se a “regras da ICP-Brasil” como se estas regulassem o processo eletrônico. Tais “regras” referem-se exclusivamente a atributos de ordem técnica que objetivam garantir a autenticidade, a integridade e a validade jurídica de documentos em forma eletrônica.

Ocorre que é a lei especial do processo judicial informatizado que normatiza o peticionamento e a prática geral de atos processuais, prescrevendo a obrigatoriedade do cumprimento do requisito de utilização de assinatura digital baseada em certificado emitido pela cadeia de confiança da ICP-Brasil.

Logo, criou-se um insólito regramento híbrido – regulador do procedimento de propositura do mandado de segurança – que além de ferir o princípio de regência da Lei 11.419, causa indesejável insegurança jurídica quanto à necessidade de se também apresentar em juízo o original da petição e os documentos encaminhados por meio eletrônico.

Adjetivamente cumpre esclarecer que não reside qualquer responsabilidade do impetrante do mandado de segurança, quanto ao citado “meio eletrônico de autenticidade comprovada”. A Lei 11.419 instituiu o critério de adesão voluntária aos órgãos do Poder Judiciário que desejem desenvolver sistemas eletrônicos de processamento de ações judiciais por meio de autos digitais. Dessa forma compete exclusivamente ao Poder Judiciário a disponibilização e manutenção dos sistemas de processamento de ações judiciais por meio de autos digitais, o qual se exige a capacidade de fornecimento de recibo eletrônico de protocolo.

Dessa forma, ao invés de buscar a modernização do instituto jurídico do mandado de segurança, equivocadamente, adentrou-se no campo de sua instrumentalização. Nessa seara pode-se afirmar que o que é bom não é novo. E o que é novo, não é bom.

Conselho Federal da OAB. Revista Eletrônica

OAB/RJ. Tribuna do Advogado

 2009

A inútil proposta legislativa de divórcio online

Acesse a charge do divórcio na internet

Entre as pérolas cultivadas no Senado Federal, emerge o Projeto de Lei 464/2008 de autoria da Senadora Patrícia Saboya, iniciativa absolutamente inútil como se demonstrará.

A proposta legislativa pretende incluir o artigo 1.124-B ao Código de Processo Civil, a fim de que “a separação consensual e o divórcio consensual, não havendo filhos menores ou incapazes do casal, e observados os requisitos legais quanto aos prazos, poderão ser requeridos, ao juízo competente, por via eletrônica, conforme disposições da Lei nº 11.419/2006, que dispõe sobre a informatização do processo judicial”.

Em sua justificativa a Senadora alerta para a necessidade de empreender “nova revolução nesse campo, com a utilização dos meios eletrônicos para a solução formal dos casamentos que chegam ao fim”.

Parece que a Senadora, assim como a Comissão de Constituição e Justiça do Senado, não leram a Lei que instituiu o processamento de ações judiciais por meio digital. E, se o fizeram, não entenderam.

Isto porque a Lei 11.419 já autoriza uso de meio eletrônico na tramitação de processos judiciais, aplicando-se indistintamente aos processos civil, penal, trabalhista e aos juizados especiais em qualquer grau de jurisdição. Pergunta-se então, onde se localiza a conclamada “inovação” da medida, uma vez que também as ações de divórcio e separação se encontram abrangidas pela Lei 11.419.

Registre-se, ainda, que inexiste a obrigatoriedade da implantação de sistema de processamento de autos digitais. O diploma legal instituiu o critério de adesão voluntária aos órgãos do Poder Judiciário que desejem desenvolver sistemas eletrônicos de processamento de ações judiciais por meio de autos digitais, cabendo a qual a regulamentação no âmbito de suas respectivas competências.

Sendo assim, caso o órgão jurisdicional não disponha de recursos tecnológicos que proporcionem a tramitação processual por meio eletrônico, os autos não poderão tramitar por tal sistemática!

Matérias veiculadas na imprensa atribuem à senadora a autoria de declarações que propugnam pela supressão da obrigatoriedade de audiência entre as partes, pela dispensa de advogados no divórcio on-line, assim como pela equiparação da instituição do casamento a um mero contrato: “quero facilitar o divórcio de casais sem filhos, pois, se há acordo, é como se fosse um mero contrato desfeito”.

Em relação à pretendida “dispensa de advogados no divórcio on-line”, cumpre informar a Senadora que seu desejo não encontra qualquer respaldo legal. A Lei 11.441/2007 – que possibilitou a realização de inventário, partilha, separação consensual e divórcio consensual por via administrativa – em nenhum momento dispensa a presença do advogado. Ao contrário, prevê expressamente que a escritura somente será lavrada pelo tabelião caso haja assistência de advogado.

Finalmente, no que tange a possibilidade de equiparação do casamento a um mero “contrato” – pensamento que floresceu a partir do século XVIII – caso em que sua validade e eficácia dependeriam unicamente da vontade das partes, constitui-se como pensamento ultrapassado, vez que, no nosso sentir, matrimônio é bem mais que isso, eis que se apresenta como uma instituição de Direito.

E assim o é por constituir, o casamento, um conjunto complexo de regras impostas pelo Estado (como o dever de fidelidade e a obrigação de mútua assistência, por exemplo), ao qual as partes possuem apenas a faculdade de aderir e em o fazendo a vontade dos cônjuges se torna impotente, salvo nos caso previstos em lei, operando-se automaticamente os efeitos da instituição.

Ressalte-se que a instituição do casamento é do interesse primordial do estado, encontrando tanto previsão quanto proteção na Constituição Federal.

Como sinteticamente provado, a anunciada “revolução” estabelecida por tal projeto de lei, além de desnecessária, não passa de mera falácia, como tantas produzidas neste País.

Co-autoria com Luiz Octávio Rocha Miranda da Costa Neves
2009