outubro 3, 2010 por em Cliques
Limitação no e-DOC pode prejudicar direito de defesa
Por Gilberto Marques Bruno no CONJUR
A advogada Ana Amélia Menna Barreto de Castro Ferreira escreveu: “Intempestividade recursal por que o arquivo informático é superior a 2MB ou correspondente a mais de 50 folhas impressas?”.
Como Ana Amélia disse, a lei que instituiu a informatização do processo judicial “não trouxe qualquer dispositivo limitativo ou inibitório relativo à quantidade de páginas das petições transmitidas, ou o seu equivalente em megabytes.” É um problema sério.
Embora o texto legislativo delegue aos órgãos do Poder Judiciário, dentro de suas competências, as formas pelas quais, cuidarão das respectivas regulamentações dos procedimentos atinentes ao “processo virtual”, a postura de limitar a remessa de documentos pelo sistema e-DOC da Justiça do Trabalho, com arquivos de no máximo 50 folhas impressas ou dois megabytes, não é das mais salutares.
De um lado, alguns podem até dizer enfaticamente que se trata de uma atitude correta, na medida em que, a utilização do Sistema Integrado de Protocolização e Fluxo de Documentos Eletrônicos, criado pela Justiça do Trabalho, tem caráter eminentemente facultativo, posto que, o Poder Judiciário, ainda deverá conviver por certo tempo, com duas realidades, de movimentação de feitos, uma pelo meio físico e outra pelo meio virtual.
Ainda assim, o limite de dados ou folhas para impressão, além de comprometer o trabalho técnico propriamente dito, prejudicando o desenvolvimento de teses mais aprofundadas em manifestações ou recursos e outras peças processuais, com a limitação do seu conteúdo, estaria também, até certo ponto, evidenciando a ocorrência de cerceamento ao direito de petição, cuja previsão legal, encontra sustentáculo na Carta Constitucional brasileira.
De outro lado, sem adentrar no mérito da legalidade ou validade de um ato normativo em relação a uma lei, quer me parecer que o Tribunal Regional do Trabalho da 3ª. Região, ao editar a Instrução Normativa 03/2006, aparentemente, acautelou-se em fazê-lo, dentro dos parâmetros da sua competência funcional, observando os preceitos autorizadores contidos na lei que instituiu o que costumo definir como “processo virtual”.
Sob essa ótica, poder-se-ia dizer que a criação do ato normativo limitador, estaria correta, ou seja, a forma pela qual se deu sua instituição para tratar do assunto teria sido a adequada.
Entretanto, na medida em que, passou a determinar que as petições e seus anexos, tenham no máximo 50 folhas impressas, respeitado o limite de dois megabytes, sob pena de seu não processamento, penso que se deu a adoção de postura que vai em sentido diametralmente oposto a direito constitucionalmente previsto.
Indícios de cerceamento ao direito de defesa e de inibição ao exercício do direito de petição tornam-se fortes se for levado em conta que a decisão que entendeu pela intempestividade recursal foi embasada no fato de que a peça processual enviada pelo sistema e-DOC, suplantava o limite de 50 folhas impressas e/ou o espaço de 2 MB, aspectos esses, que no meu sentir, devem ser observados com certa preocupação.
Especialmente, se levarmos em conta que, se todos os órgãos do Poder Judiciário nacional adotarem a modalidade de interpretação restritiva ou limitativa para o tráfego de manifestações pelo sistema eletrônico, o “processo virtual” estaria correndo sério e grave risco de ser relegado a um segundo plano, pois, certamente, os advogados e demais operadores do direito, não optariam em utilizá-lo se tivessem que sacrificar os conteúdos técnicos de suas manifestações diante da limitação de tamanho de arquivos a serem enviados eletronicamente. Mas não é só isso. E quando não mais existir o meio físico e os processos tramitarem apenas e tão somente pelo meio eletrônico? Como vai ser? Se houver a prevalência de tais limitações? Arquivos em tamanhos superiores a 2 MB, teriam previamente o seu decreto de intempestividade?
O problema poderá tomar proporções muito mais complicadas, pois o que estará em risco é o direito do cidadão em buscar no Poder Judiciário, a prestação jurisdicional, a reparação de um eventual direito seu que fora lesado. A sociedade será prejudicada em conjunto ou individualmente no seu direito de “fazer valer o seu direito”, por conta de limitações meramente técnicas sobre tamanho de arquivos a serem enviados pelo meio eletrônico ou número de folhas a serem objeto de impressão.
Por esses, e, tantos outros motivos, a sistematização e a padronização de procedimentos em torno das questões que envolvem o “processo virtual” devem-se somar às experiências até então desenvolvidas, os erros e acertos vivenciados no dia a dia dessa nova realidade que já opera em vários tribunais do país, de sorte que, por um esforço conjunto do Poder Judiciário, do Ministério Público, da Advocacia Geral da União, da Defensoria Pública, da Ordem dos Advogados do Brasil e até mesmo do Conselho Nacional de Justiça, fossem adotados mecanismos e sistemas semelhantes voltados a operacionalizar o funcionamento do processo pelo meio eletrônico.
É importante ressaltar que, dentro de tais mecanismos, e, respeitando-se as peculiaridades de cada um dos setores envolvidos, a “virtualização do processo” e a “inclusão digital” de magistrados, procuradores, advogados e demais operadores do Direito, dar-se-ia de forma muito mais simples, com soluções práticas e objetivas, redundando em resultados positivos, com reais benefícios para toda a sociedade.
Especialista em Direito Público, sócio do Marques Bruno Advogados Associados