novembro 25, 2009 por em Entrevistas

Legislação eleitoral ameaça livre circulação de idéias

A um dia do primeiro turno das eleições municipais de 2008, não são só os candidatos que estão insatisfeitos com as regras eleitorais. Em carta ao jornal Folha de S. Paulo, o diretor-executivo da Central Globo de Jornalismo, Ali Kamel, afirmou que as normas referentes aos debates de candidatos na TV são restritivas à liberdade de expressão e que cidades como São Paulo e Rio de Janeiro ficariam sem os debates na emissora, tendo em vista a falta de acordo com os partidos.

Não é apenas a regulamentação dos debates eleitorais que acabou restringindo a livre circulação de informações durante todo o processo eleitoral. Com o propósito de garantir a igualdade de condições entre os competidores e de limitar os exageros com os gastos de campanha, a legislação eleitoral proíbe quase tudo e ameaça a livre manifestação das idéias.

O presidente do Tribunal Superior Eleitoral, ministro Carlos Ayres Britto, afirmou à revista Consultor Jurídico, que a emissora poderia ter feito, formalmente, uma consulta ao TSE. “Quem sabe teríamos dado uma interpretação mais atual e flexível?”.

Para o especialista em Direito Eleitoral, advogado Renato Ventura, a Lei Eleitoral está certa ao estabelecer as restrições e que o problema dos debates tem origem em outra legislação. “O erro não está na Lei Eleitoral, mas na Lei dos Partidos Políticos que permite surgimento de siglas de aluguel”, afirma, em relação à dificuldade em se realizar debates com os candidatos.

Ao explicar sobre as restrições impostas pela Lei Eleitoral, Ventura afirma que as emissoras de rádio e TV têm de ser “totalmente imparciais” ao tratar os candidatos. Isso porque, afirma, são veículos que exercem grande influência junto ao público. “Uma coisa é São Paulo e Rio. Outra coisa são pequenas emissoras que atuam no interior, em cidades pequenas”, afirma. Ventura lembra, ainda, que muitos políticos detêm concessões de rádio e TV. Com as restrições, explica, pretende-se evitar manipulações.

O advogado também explicou que a Lei Eleitoral distingue jornal de TV e rádio por entender que a imprensa escrita atinge uma pequena parcela da população, mais esclarecida. “Por isso, as regras são diferentes”. Além disso, segundo Ventura, a relação custo/benefício da propaganda no jornal não é tão vantajosa.

Igualdade para concorrer

Para o ministro Ayres Britto, as restrições previstas pela Lei 11.300/06 favoreceram a igualdade entre os candidatos, na medida em que houve o barateamento da campanha.

O ministro Marco Aurélio, do Supremo Tribunal Federal, e presidente do TSE por ocasião das eleições em 2006, também afirmou à ConJur, que, a partir da lei, houve a simplificação da campanha. Entende que as regras buscaram dar ênfase ao conteúdo e aos perfis dos candidatos. Com isso, a lei afastou o showmício e a sujeira provada por cartazes e outdoor. Para ele, não se pode apresentar um “candidato só de fachada” e que possa iludir o eleitor. “Não dá para aplicar o Código do Consumidor por propaganda enganosa”, constata.

Renato Ventura concorda. Segundo ele, showmícios, propaganda em postes e viadutos e a distribuição de brindes foram proibidas a fim de evitar o favorecimento de candidatos com mais condições financeiras. O advogado também entende que a proibição de outdoor fez com que os gastos com campanhas diminuíssem, permitindo maior igualdade entre os candidatos. Pela lei, os candidatos só podem fixar painéis de até 4 metros quadrados em bens particulares.

“A função do Direito Eleitoral é permitir igualdade entre os candidatos”, afirma Ventura. Para o especialista, uma pequena desigualdade entre os que pleiteiam o cargo de parlamentar sempre existe, mas a lei ajudou a reduzir o abismo entre os candidatos.

Marco Aurélio afirma que a restrição está na lei e que o tribunal atua de acordo com as normas previstas. Ele explica que o objetivo é garantir tratamento igualitário. “É o que norteia o STF e a Justiça Eleitoral”, afirma.

Fora da rede

O presidente do TSE, ministro Ayres Britto, sabe que as regras eleitorais acabaram por criar algumas dificuldades aos candidatos. No caso da internet, o TSE entendeu que os juízes regionais deveriam decidir conforme o caso concreto quando se deparassem com questões sobre propaganda eleitoral na rede. A decisão, constata o ministro, fez com que os candidatos ficassem com receio de usar a rede.

Ayres Britto entende que a internet é um meio democrático, de fácil acesso, que atrai jovens e garante a igualdade entre os candidatos. Na Consulta 1.477, formulada pelo deputado federal José Fernando de Oliveira, o ministro votou a favor da liberação da propaganda na rede.

O fato é que, ao equiparar a internet ao radio e à televisão, que são concessões públicas, a legislação inviabilizou o uso da rede de computadores nas eleições e desperdiçou-se uma grande oportunidade.

Estados Unidos

Nos Estados Unidos, a internet tem papel importantíssimo na campanha presidencial. A pré-candidata democrata Hillary Clinton, por exemplo, anunciou tanto sua entrada na disputa como sua retirada da campanha pela internet. A arrecadação de fundos para a campanha através da rede teve enorme participação: o candidato democrata Barak Obama cadastrou mais de 2 milhões de doadores, enquanto o republicano registrou 600 mil. São todos pequenos doadores, que contribuem com quantias inferiores a US$ 100.

No Brasil, que é um campeão em uso da internet, a legislação desligou a rede das eleições. Responsável por assessorar o deputado federal na consulta ao TSE, a advogada Ana Amélia Castro Ferreira, do Instituto dos Advogados Brasileiros, entende que, ao menos no que se refere à propaganda eleitoral na internet, as restrições não possibilitaram maior igualdade entre os candidatos.
A advogada lembra que, além de ser mais democrática, a internet é a mídia mais barata. “A publicação de banner na rede custa bem menos do que em outras mídias”, afirma. Além disso, explica, a web não se sujeita à pressão de grandes grupos econômicos.

Agenda política

As eleições municipais de 2008 começaram a causar polêmica antes mesmo de as campanhas eleitorais serem permitidas. Em junho, o Ministério Público Eleitoral de São Paulo entrou com representações contra a pré-candidata à prefeitura Marta Suplicy (PT-SP), o atual prefeito Gilberto Kassab (DEM-SP), e os jornais Folha de S.Paulo, O Estado de S.Paulo e a revista Veja São Paulo. O motivo foram entrevistas concedidas aos veículos de comunicação em período pré-eleitoral.

Pelas regras atuais, os candidatos só podem se manifestar a partir de determinado dia. Nestas eleições, entrevistas que divulgassem propostas dos postulantes ao cargo de vereador ou prefeito só poderiam ser veiculadas após o dia 6 de julho, sob pena de tanto o candidato quanto o veículo serem multados.
Em entrevista à ConJur na época, o constitucionalista Luís Roberto Barroso afirmou que há uma dificuldade em diferenciar propaganda de manifestações de opinião. “A minha convicção é de que esse juízo não deve ser excessivamente rigoroso, em homenagem aos princípios da liberdade de expressão e informação. Na verdade, é cada vez mais recorrente a percepção de que o debate travado no espaço público é essencial para a democracia. O ideal é que essa discussão se produza de forma continuada, a fim de criar um ambiente republicano de fiscalização do poder e produção de idéias”, afirmou.

Boca de urna

Citado pelos juízes eleitorais em suas decisões, o advogado Renato Ventura explica que a lei não veda a liberdade de manifestação. Ele explicou a diferença quando se trata de internet. As pessoas podem manifestar apoio ao candidato, mas não tentar convencer outras pessoas a votarem nele.

O entendimento é semelhante quando se trata de boca de urna, prática proibida pela legislação brasileira. Ventura alerta que boca de urna não é só distribuição de santinhos, mas qualquer ação que busque convencer um eleitor a votar em determinado candidato. O objetivo, explica, é não permitir que a pessoa mude o voto na hora da eleição, já que a escolha de um representante se dá a partir de uma reflexão. “Tentar convencer alguém, mesmo sem entregar qualquer material constitui boca de urna”, afirma. A pessoa flagrada fazendo boca de urna pode ser presa em flagrante.

Já a manifestação silenciosa e individual é permitida. “O eleitor pode pregar um adesivo no carro ou usar um bottom de seu candidato. Faz parte da livre expressão”, explica. Situação diferente é um grupo de amigos com bottons e bandeiras reunidos em manifestação coletiva. A prática é proibida. Segundo Ventura, alguns eleitores podem ser influenciados ao se deparar esse tipo de manifestação.

O excesso de restrições tem causado contrariedades. Em editorial, na última quinta-feira (2/10), o jornal Folha de S. Paulo se refere a “uma série de determinações burocráticas cujo maior efeito é colocar a democracia brasileira sob uma demasiado rígida tutela judicial”. E conclui: “a lei em vigor, e as interpretações draconianas que inspira, restringem ainda mais o alcance do debate -e o próprio desenvolvimento da cultura democrática no país”.

Revista Consultor Jurídico

As regras da campanha eleitoral na internet

Estamos em ano de eleições municipais. As regras em relação aos jornais, rádio e TV estão claras, de acordo com a Justiça eleitoral. E sobre internet?

A propaganda eleitoral realizada pela Internet ou por outros meios eletrônicos de comunicação foi regulamentada pelo TSE. Nenhuma norma impede a propaganda por meios eletrônicos, excetuadas as proibições expressas.

A grande maioria das denúncias apresentadas perante a Justiça Eleitoral se relaciona à propaganda antecipada veiculada na internet, punindo-se eventuais abusos a partir de casos concretos.

Como a internet é um meio de comunicação que comporta a utilização de uma infinidade de mecanismos de propaganda eleitoral, considero improvável a regulamentação de cada modalidade de propaganda na rede.

Como os candidatos poderão usar a internet?

Como mecanismo de propaganda eleitoral permite-se que o candidato mantenha página na internet, podendo se registrar sob o domínio pontocan ou em outras categorias, como o pontocom. O registro sob a terminação pontocan, válido apenas durante o período eleitoral, deve obrigatoriamente conter a especificação .

A propaganda na internet somente será admitida na página do candidato destinada exclusivamente à campanha eleitoral.

A internet deveria ter as mesmas regras estipuladas para rádio e TV?

A propaganda na rede se subordina as mesmas limitações impostas aos outros meios de comunicação.

Ocorre que se trata de mídias que não guardam similaridade entre si. Enquanto em outros veículos o conteúdo da propaganda é imposto, na internet a decisão é do usuário, este é quem escolhe sua “programação”. Para isso navega buscando o conteúdo que deseja acessar, a qualquer hora do dia ou da noite.

Penso que se está diante de uma questão cultural de assimilação do ambiente digital. Se o eleitor pode se dirigir à sede física de um partido político para conhecer seu programa partidário, ou ao birô de algum candidato, porque seria proibido visitar uma sede virtual mantida no second life? Um eleitor que não deseja se deslocar para o local de realização de um comício pode ser privado de ouvir o discurso de seu candidato pelo computador?

Um candidato, pela atual legislação, pode gravar um vídeo e postar no YouTube?

Entendo ser permitido esse tipo de propaganda, desde que atendidos os limites da propaganda eleitoral em geral.

Os blogs, jornalísticos ou não, podem apresentar vídeos de candidatos com suas plataformas políticas via YouTube?

Lembrando-se que é expressamente proibido o pedido de votos antes do início da propaganda eleitoral, o titular de blog pessoal pode manifestar sua preferência por determinado candidato, mesmo sem o seu conhecimento ou autorização.

Os blogs que se hospedam nas web pages de empresas de comunicação devem ter cuidado quanto ao respeito ao princípio da igualdade, concedendo idêntica oportunidade de exposição a todos os candidatos, sem qualquer tratamento privilegiado a candidato ou partido político.

Em ambos os casos os titulares são responsáveis pela veiculação da propaganda eleitoral. Se esta for considerada irregular pela Justiça Eleitoral a propaganda será retirada do ar, sujeitando o responsável pela publicação e também o candidato, se ficar comprovado seu prévio conhecimento, ao pagamento de multa pecuniária.

Blogs e sites hoje em dia podem funcionar como jornal, rádio e TV, veiculando matérias escritas, faladas e imagens. O que a legislação diz sobre isso diante do crescente numero de blogueiros na internet?

Não existe nenhuma regra específica quanto à utilização de sites ou blogs de terceiros, de cunho informativo ou jornalístico. Segundo entendimento do TSE, estes não se equiparam às empresas de comunicação.

Se forem mantidos por empresas de comunicação social, que se sujeitam ao cumprimento de regulação específica, se aplica ao conteúdo reproduzido na internet as mesmas regras da propaganda na imprensa, rádio e TV.

O orkut, o maior site de relacionamento da internet, também pode ser usado por candidatos?

Não existe qualquer vedação quanto ao uso dessas comunidades sociais, que igualmente se submetem ao cumprimento das regras de propaganda eleitoral. Sendo utilizadas para lançar candidaturas e pedir votos, geralmente são alvo de denúncias por propaganda eleitoral antecipada, ou, em outros casos, por atacarem a honra de adversários. A propaganda irregular veiculada pelos meios eletrônicos não passa despercebida pela Justiça e pelo Ministério Público Eleitorais. A empresa responsável pelo orkut tem sido acionada para retirar do ar as páginas que violaram a legislação eleitoral.

A legislação diz que propaganda eleitoral só a partir de julho. É permitido ouvir os pré-candidatos, no rádio, jornal ou TV? Qual o limite da entrevista jornalística e da propaganda?

Entende-se como ato de propaganda eleitoral aquele que leva ao conhecimento geral, ainda que de forma dissimulada, a candidatura e a ação política que se pretende desenvolver.

O entrevistado não pode se apresentar na condição de candidato ou sua imagem veiculada de forma reiterada.

Se a entrevista for realizada com um prefeito ou vereador, estes podem se manifestar sobre assuntos referentes ao seu atual mandato. A regra também se aplica ao candidato que não detenha mandato eletivo: um empresário pode ser entrevistado sobre a atuação de sua empresa, um esportista sobre suas conquistas, sem qualquer menção sobre sua candidatura ou pedido de voto.

No horário gratuito destinado aos partidos políticos, pode-se veicular imagem e mensagens de integrantes de seus quadros partidários, desde que não explicitem ou façam menção à sua condição de candidato.

Eventuais abusos, excessos e uso indevido dos meios de comunicação, são apurados e punidos, quando for o caso.

A falta de legislação em sua opinião, não deixa a utilização da internet sem limites?

Absolutamente. Por qualquer modalidade de veiculação a propaganda eleitoral se sujeita ao cumprimento das normais eleitorais. Deve atender aos princípios gerais da propaganda política que estabelece a igualdade entre os candidatos e impede o abuso do poder econômico.

A Justiça Eleitoral exerce o poder de polícia sobre a propaganda eleitoral, tomando providências para inibir práticas ilegais. O Ministério Público tem legitimidade para intervir na fiscalização no processo eleitoral, podendo qualquer cidadão apresentar sua denúncia.

Considero que o ponto sensível se relaciona à fiscalização da propaganda irregular na internet.

O que não está escrito na Lei significa que é permitido?

Na consulta formulada ao TSE pelo Deputado Federal José Fernando Aparecido de Oliveira, onde se indagou a legalidade de diversas práticas de propaganda eleitoral realizada pela internet – a assessoria especial enfatizou em seu parecer que no campo da propaganda eleitoral, o que não é previsto é proibido. Apesar dos Ministros ainda não terem se pronunciado sobre as questões levantadas, existe uma sinalização do órgão técnico do Tribunal.

Se por um lado não temos uma legislação específica para a utilização da internet parece, por outro, que os candidatos no Brasil também não sabem como usar a grande rede de computadores, como nas eleições americanas. Concorda?

Acho que vivemos um grande paradoxo. A Justiça Eleitoral brasileira é a maior protagonista na utilização de recursos digitais, sendo referência mundial pela adoção da urna eletrônica. O site do Tribunal disponibiliza canal de denúncia on line e expede certidão de quitação e de crimes eleitorais. Mas a legislação eleitoral não avança na mesma medida.

Enquanto os Estados Unidos ainda vivenciam um sistema eleitoral da era jurássica, seus candidatos podem fazer uso ilimitado dos recursos digitais.

Como acompanho a tímida presença dos políticos brasileiros na rede, ainda os considero “sem ponto”. Não conhecem, não entendem, não confiam e também não apostam no grande instrumento de poder que representa a mídia digital. Apenas no período eleitoral montam um web site, de custo bem reduzido, sem qualquer funcionalidade prática, que o abandona depois da eleição. Compram listas de e-mails e praticam spam eleitoral, enviando santinhos eletrônicos indiscriminadamente.

Desconhecem que o marketing político digital faz uso de uma mídia permanente e barata, que viabiliza a criação de um canal independente de aproximação, fidelização e interação com o eleitor. A internet tem uma característica única, não fecha: funciona 24 horas, 365 dias por ano. Se usada com eficiência representa um diferencial competitivo de extrema importância, também para cativar a militância do eleitorado jovem, altamente conectado.

Por outro lado deve-se levar em consideração que o elevado índice de exclusão digital e a predominante infra-estrutura de acesso à internet por linha discada, dificulta a sedimentação da cultura digital. Soa a ficção científica falar-se de propaganda eleitoral pela internet em municípios desconectados e mesmo naqueles distantes dos grandes centros.

Já nos Estados Unidos, nessa campanha presidencial o pré-candidato democrata Barack Obama se transformou em exemplo de exploração eficiente de recursos digitais. Seu site criou espaço para blogs e webTV, permite debates entre os eleitores, suas perguntas são respondidas em tempo real, recebe doações, comercializa material de campanha na loja virtual e criou um site móvel, acessado pelo celular. Para coroar suas ações de marketing digital, seu último discurso lidera o ranking do vídeo mais visualizado na história do YouTube.

Quais seriam seus conselhos a candidatos e proprietários de sites e blogs, jornalísticos ou não?

Do ponto de vista legal atendam as regras gerais da propaganda eleitoral, lembrando-se que está prevista a responsabilidade solidária pela veiculação de propaganda irregular, tanto do responsável pela publicação quanto do candidato, se comprovado seu conhecimento.

Para não ser alvo de denúncias e representações eleitorais, concedam idêntica oportunidade de exposição e participação a todos os concorrentes nos debates realizados por chat, entrevistas e matérias jornalísticas. A orientação também se aplica a programação da webTV e web rádio.

Como o blog é um espaço de opinião, os blogueiros devem dedicar especial atenção ao espaço reservado para comentários dos usuários.

Quanto aos candidatos, sigam as regras básicas de qualquer relacionamento social: façam uso ético das ferramentas eletrônicas; pratiquem ações de marketing de permissão, jamais de invasão; respeitem os direitos dos usuários-eleitores de não receber mensagens não solicitadas e quando disponibilizar um canal de aproximação, respondam as mensagens eletrônicas enviadas. Não importune nem desaponte seu único cliente: o eleitor.

Revista Eletrônica Interpress

Participação no Second Life requer cuidados

Empresas estão investindo e expandindo negócios para o outro lado do computador

Simone Garrafiel

O Second Life – simulador da vida real em um mundo virtual em 3D – tem despertado a atenção de muitas empresas, que perceberam vantagens nesse mundo e a capacidade de criação e geração de oportunidades. Com isso, muitas estão investindo e expandindo seus negócios para o outro lado da tela do computador. Em um espaço onde é viável personalizar seus negócios, advogados alertam que a falta de legislação específica e a facilidade de violação dos direitos de marca e autorais são fatores que requerem atenção dos gestores.

O advogado especializado em direito digital e crimes na Internet, Renato Opice Blum, explica que as organizações entram no Second Life (SL) para fazer negócios ou promoções, prestar serviços ou, simplesmente, para trabalhar a marca. Em se tratando de objetivos comerciais, ele orienta que se torna imprescindível que haja um contrato entre as partes envolvidas e, nesse mundo virtual, isso acontece de forma verbal entre os avatares – personagens virtuais criados para circular no ambiente do SL -, bastando que as conversas sejam gravadas. “É um contrato verbal dentro de um ambiente tridimensional. Mas é este que irá preservar as partes em caso de problemas na transação realizada e servirá de objeto para possível ação judicial”, diz o advogado.

Antes mesmo de iniciar as atividades, é preciso estar atento aos principais pontos do termo de uso do SL, conforme informa Blum. Entre as regras do mundo virtual estão: o usuário precisa reconhecer e respeitar os direitos aos respectivos conteúdos protegidos por direitos autorais, leis incidentes sob tais direitos e provisões de tratados, ter responsabilidade e obrigações totais pelo uso de qualquer conteúdo e pela violação de quaisquer ditos direitos e abrir uma conta, usando informações verdadeiras, exatas e atualizadas.

“Quando criar o nome no Second Life, este não deverá ser enganoso, ofensivo ou constrangedor, evitando assim a utilização do nome de outras pessoas, nome que viole marca registrada, direitos autorais e nome de funcionário da própria empresa responsável pelo software”, explica Blum.

Ainda assim, a violação do direito de marca, plágios e outras infrações são registrados com freqüência. Marcelo Goyanes, especialista em Direito do Entretenimento, do Veirano Advogados, informa que muitos avatares violam os direitos de terceiros, usando o nome ou a imagem de pessoas. “Para as empresas se precaverem há softwares que permitem identificação de utilização irregular, mas uma medida preventiva seria notificar a empresa que presta este serviço, no caso a Second Life Brasil, e requerer que sejam tomadas medidas de cautela. Essa notificação atua como um canal de comunicação entre o website e a marca e pode ser utilizada como objeto de ajuizamento de ação caso ocorra alguma anormalidade. Nesse caso, o juiz pode interpretar que a empresa SL estava ciente de que poderia haver violação de direito e determinar que retire o conteúdo do ar”, ressalta Goyanes.

Ana Amélia Mena Barreto, professora da FGV em Direito e Tecnologia e membro do Instituto dos Advogados Brasileiros (IAB), explica que o regramento para ambientes virtuais é o mesmo do mundo real. “Parte-se da premissa de que esse ambiente virtual depende do real. Assim, não há necessidade de se criarem leis específicas. O que está sendo feito, atualmente são ajustes para modernização legislativa, para que os códigos tenham novos artigos que estabeleçam a aceitação do meio eletrônico. Temos, por exemplo, a Lei do Direito Autoral, então, independente de onde tenha sido praticada a violação, o fundamento jurídico será o mesmo”, destaca a advogada.

É o caso do Projeto de Lei 89/2003, que tramita no Senado, o qual, se aprovado, trará a previsão de condutas hoje não presentes em lei, tais como a disseminação de vírus, a invasão de sistemas e outros delitos relacionados aos meios eletrônicos. Marcelo Goyanes diz que o objetivo do projeto é proporcionar segurança na internet contra atos irregulares. “Este projeto atinge o Second Life, pois prevê crimes que são praticados no ambiente físico, como a difusão de vírus digital e o furto de senhas, os quais podem ser cometidos no mundo tridimensional. Se aprovado, protegerá com mais veemência a troca de informações”, ressalta o advogado.

Sobre a participação de escritórios de advocacia no SL, que hoje ocorre apenas como forma de fidelização de marca, Ana Amélia explica que o estatuto da OAB é o regente. “Houve um posicionamento da OAB-SP em relação a essa questão, o qual estabelece que os escritórios que lá ocuparem espaço não podem utilizar o meio para captação de clientes, seja com remuneração ou não”, alerta.

Outro ponto destacado por Ana Amelia diz respeito à questão tributária das transações realizadas via SL. De acordo com a advogada, nos Estados Unidos, a Receita Federal do país estabeleceu que serão cobrados os ganhos gerados pelos negócios e, provavelmente, essa cobrança será efetuada também no Brasil. “Lá, se a empresa ganha dinheiro no SL e não há conversão para a moeda real, não há cobrança incidente, mas se o valor recebido em liden, a moeda local, for revertido para dólar, aí sim segue-se a arrecadação”, observa.

Jornal do Commercio
2007

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